Zahra Khanom Tadj es-Saltaneh, uma memorialista da Dinastia Qajar

Poucos dias atrás, me enviaram uma publicação de uma suposta princesa iraniana chamada Qajair, que teve 145 pretendentes da alta nobreza e 13 deles tiraram a vida à sua rejeição – ela era considerada símbolo de beleza, apesar do padrão de beleza da maioria daqueles que comentaram na publicação claramente não concordavam com isso. A página do Facebook, que me pareceu mal pesquisada logo no início, me deixou um pouco curiosa e decidi pesquisar a fundo sobre o tema.

A publicação do Facebook.

Foi quando descobri que Qajair não era uma princesa, e sim o nome de uma dinastia, e que uma das mulheres associadas com símbolos de beleza na época era Zahra Khanom Tadj es-Saltaneh, uma princesa persa e memorialista da Dinastia Qajair – de fato, a primeira memorialista. Quanto as fotos da tal princesa, não eram precisamente corretas – em 1848, o Shah Nasser al-Din Shah Qajar permitiu que pela primeira vez na história um harém real fosse fotografado, e essas são as fotos de algumas de suas esposas.

 

Primeiro, falaremos de Zahra Khanom Tadj es-Saltaneh (1883 – 1936). Princesa persa, era filha de Nasser al-Din Shah, Rei da Pérsia de 1848 a maio de 1896, filha de uma de suas esposas, Turan es-Saltaneh. Ela era casada com Amir Hussein Khan Shoja’-al Saltaneh, com quem teve duas filhas e dois filhos. Ela era o interesse amoroso do famoso poeta do Irã Aref Qazvini.

Zahra.

Embora não exista relato de que qualquer homem tenha se suicidado por ela, Taj foi pioneira dos direitos das mulheres no Irã, uma das fundadoras do grupo Anjoman Horriyyat Nsevan (Sociedade da Liberdade das Mulheres), que trabalhava pela igualdade de direitos no início do século 20. Além disso, Taj era escritora, pintura, intelectual e ativista, que dava noites literárias em sua casa uma vez por semana, e a primeira mulher na corte persa a tirar o hijab e usar roupas ocidentais.

Suas memórias foram publicadas sob o título (Coroação da Angústia: Memórias de uma Princesa persa do Harem para a Modernidade 1884-1914) em 1996. Tadj se destaca pois, muito antes de memórias de mulheres da diáspora iraniana se tornarem populares no Ocidente, ela escreveu um livro sobre suas memórias. Apesar de ser criada no harém, onde o ardor e egoísmo do Xá reuníam centenas de mulheres que competiam constantemente pela sua atenção, Tadj cresceu sem esse sentimento de superficialidade e materialismo. Em suas memórias, ela foi muito franca em criticar o patriarcado e atraso das ações de seu pai e seu irmão, Mozaffar-al-Din Shah. Quando ela fala sobre sua dor após o assassinato de seu pai, ela lembra ao leitor sobre o seu maior sofrimento sobre o presente e o futuro do Irã. Suas memórias mostram que Tadj estava familiarizada com arte, música, pintura, história e até literatura francesa.

Estilisticamente, o estilo das memórias de Tadj se encaixam no subgênero da escrita de biografia persa chamada khaterat, onde existe uma mistura do mundo pessoal e do público, uma mistura das memórias individuais e coletivas. Tadj conta sobre suas lembranças de infância no harém, o assassinato de seu pai, e seu novo casamento depois do divórcio de seu marido. Ela investiga e analisa o pano de fundo de eventos históricos. Ela cobre trinta anos de sua vida, que foi um período na história do Islã onde a sociedade passou da antiga para tradicional para algo novo e moderno. Foi um momento de rápida mudança e confusão. As mulheres no EUA, França e Grã-Bretanha já haviam ganhado o direito de votar, mas apesar do seu envolvimento na Revolução Constitucional (1905 – 1907), as mulheres iranianas ainda eram privadas dos direitos básicos de cidadania. Independente de sua linhagem real, a princesa Tadj defendia avidamente a revolução constitucional.

Naser al-Din Shah Qajar

Agora, as fotos que foram alvo de diversos comentários foram as fotos das mulheres do harém de Nasser al-Din Shah Qajar (1831 – 1896), terceiro reinante mais longo da história iraniana e o primeiro monarca iraniano a visitar formalmente a Europa. O Estado de Naser era reconhecido pelo governo do Irã, mas sua autoridade era minada pela autoridade dos líderes tribais locais. Esses grupos mantinham suas próprias milícias e muitas vezes não obedeciam às leis aprovadas pela monarquia.

Uma das suas maiores paixões era a fotografia. Acredita-se que ele tenha recebido sua primeira câmera da Rainha Vitória, aos 11 anos, em 1842. Na infância, ele gostava de tirar fotos, e quando chegou ao poder, decidiu estabelecer em seu palácio o primeiro estúdio fotográfico oficial. Na década de 1870, em Teerã, o fotógrafo russo Anton Sevryugin se tornou o fotógrafo oficial da corte e do governo iraniano. Oficialmente, ele poderia filmar apenas o Xá, seus parentes, cortesões e criados masculinos. Mas sendo um fervoroso fã da fotografia, Xá permitiu que Anton fotografasse seu harém, que tinha 84 concubinas (ou esposas).

As fotografias dessas mulheres contradizem a descrição convencional da vida em um harém – elas olhem bem calmamente para a lente, sem coqueteria ou servilidade.Você poderia até imaginar que talvez as esposas do harém gostassem da companhia uma das outras; em algumas fotos, as festas de piquenique são mostradas.

Pelas fotografias, você pode avaliar os gostos do monarca iraniano. Claramente as mulheres não passavam fome e não estavam sobrecarregadas com qualquer tipo de trabalho físico. Em muitas das fotos, as concubinas são retratadas em saias curtas e decoradas de forma opulenta, chamadas “shaliteh”, semelhante ao tutu do balé. Isso não é coincidência.

Em 1879, Naser viajou para São Petersburgo a convite do czar russo Alexandre II. Lá, ele assistiu algumas apresentações de balé, e de acordo com alguns rumores, ele fiicou tão encantado com as dançarinas que vestiu algumas de suas mulheres com saias semelhantes.

Bibliografia:
Naser al-Din Shah Qajar and His 84 Wives: Rare Photographs and the Story of the Iranian Shah and His Harem. Acesso em 11/09/2017.
Zahra Khanom Tadj es-Saltaneh. Acesso em 11/09/2017.
Zahra Khanom Tadj es-Saltaneh. Acesso em 11/09/2017.
Naser al-Din Shah Qajar. Acesso em 11/09/2017.

33 Respostas para “Zahra Khanom Tadj es-Saltaneh, uma memorialista da Dinastia Qajar

    • Podem bem ser as belas na opinião do homem que as desposou, vestindo as roupas que o marido assim escolheu – e claro, quando é o marido quem dita moda, não sai coisa boa.
      Entretanto, não vamos esquecer que estas podem nem ser as mais belas, mas sim as que têm status maior dentro do harém, ou porque manobraram politicamente a corte com mais sucesso, ou porque tiveram filhos do rei.

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      • Exatamente. E outra, todas elas podem ter sido as mais belas da Pérsia por um tempo. Só olhar uma foto da filha dele quando jovem. Durante um tempo na Europa, estar acima do peso era um sinal de riqueza. Só o fato do Xá ter tido dinheiro para deixar todas essas 84 mulheres obesas deixaria claro o tanto de dinheiro que ele tinha disponível.

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  1. Mais paressem homens do que mulheres. E se o são deviam de ser obrigadas a comer para serem obesas.
    Também sei que há umas tribos muçulmanas que ainda hoje, têm o culto da mulher obessa, por isso obrigam as meninas logo de tenra idade a alimentá-las em exagero.

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    • Não tem como comparar os costumes de pequenas tribos muçulmanas com os costumes de uma corte persa no século XIX. Durante vários séculos na Europa, estar ligeiramente acima do peso era um símbolo de riqueza e status. O fato do Xá ter tido dinheiro suficiente para deixar 84 mulheres obesas deixaria claro para qualquer um o seu poder. Além disso, era algo extremamente de gosto pessoal, já que nenhum outro homem poderia ter contato (nem mesmo ver o rosto) das mulheres do Xá.

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      • Era Vitoriana, na verdade a comparação é super válida, pq o motivo é o mesmo, mostrar a opulência tanto do pai quanto do marido, e isso ainda ocorrer hj é fascinante

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          • Era Vitoriana , não seja tão literal com a palavra “forcada”, nesse caso é se incentivar o consumo constante de comida, e a inercia, para que o corpo fique como o homem delas desejava

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            • Uma vez, vi um documentário no programa Odisseia da TV que dá aqui em Portugal em que, uma delegação da UNICEF descobriu uma tribo de Berberes do deserto que praticam a engorda das meninas logo em criança. Segundo a tradição, os homens só casam com elas se forem corpulosas. É um horror e chegam a bater nas crianças por vomitar o que acabaram de comer. Isto é verdade. É uma questão de pesquisar.

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              • Falei “obrigada” pois foi isso que estava escrito no comentário ao qual eu respondi. Incentivar o consumo de comida e comer como algo cultural é uma coisa, ser obrigada a comer pelo marido para engordar é completamente diferente. E então, voltamos a questão de comparar costumes de pequenas tribos da África com a corte persa, que são coisas diferentes. Se em ambos os casos era visto como sinônimo de opulência; ok, mas como isso era praticado na corte do Xá é algo que nem eu e acredito nem você temos fontes a respeito.

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  2. Adorei a matéria! Adorei saber um pouco sobre a historia da Princesa Zahra, a diferença cultural é enorme não só pelo pais mas pela época que ela viveu, só acho triste as pessoas estarem dando mais enfase na questão da beleza das esposas( que é uma questão de gosto) do que no fato que uma princesa persa do inicio do século lutar pela liberdade das mulheres e se preocupar com o futuro do país, que infelizmente sabemos como acabou para a maioria dos países daquela região, imagino como a princesa Zahra se sentiria se visse o que a maioria dos países do oriente se tornaram hoje.

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  3. Também fiquei curiosa quando vi. Obrigado pela pesquisa foi uma ótima informação.
    E quanto a eles não serem consideradas bonitas, hoje temos um padrão de beleza bem difícil, que bom que estás mulheres eram valorizadas do jeito que eram.

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  4. Bom Dia amiga! O povo daquela época tinha uns gosto muito estranho😀😀eu acho que a beleza que contava naqueles tempos era a grama da família o poder😀😀 então tudo era belo…porque essa mulher para mim é uma assombração para os tempos de hoje…

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